FICHAMENTO DO LIVRO "CONTRATO SOCIAL"
Livro I
No Livro I, Rousseau propõe investigar
se pode haver, na ordem civil, alguma regra de administração, legítima e
segura, que tome os homens como são e as leis como podem ser, cuidando sempre
de ligar o que o direito sanciona com o que o interesse prescreve, a fim de que
a justiça e a utilidade não se encontrem divididas.
I – Assunto desse Primeiro Livro
O homem que nasceu livre hoje se
encontra limitado pela ordem social, até mesmo o que governa os demais. Como
ocorreu a mudança do estado natural ao civilizado Rousseau diz ignorar, mas
propõe descobrir o que legitima tal fato.
Considerando apenas a força e o efeito
derivado da mudança, é certo o homem obedecer a coerção que sofre pela ordem
social. Mais certo ainda é questioná-la quando necessário, pois possui pleno
direito para tanto. Todavia, a ordem social é um direito que alicerça todos os
demais e se fundamenta em convenções e não na natureza.
II – Das Primeiras Sociedades
A família é a primeira das sociedades
e a única natural. Os filhos se submetem aos pais apenas enquanto necessário
para sua conservação. Se permanecerem por mais tempo não será naturalmente, mas
por convenção. Desfeita a ligação entre estes, todos voltam ao estado de
independência, sendo cada um o seu próprio senhor a proteger sua individual
conservação.
A família é também o primeiro modelo
das sociedades políticas. O pai representa o chefe e os filhos o povo, sendo
todos nascidos livres e iguais e que alienam a liberdade apenas em função da
utilidade. A diferença é que o pai sente amor pelos filhos e o chefe sente
prazer em comandar.
Em defesa da idéia de que o poder de
governar se estabelece em favor do interesse dos governados, Rousseau condena a
concepção contrária, versada por Grotius, Hobbes e Calígula, que consiste em
estabelecer o direito pelo fato, comparando o governante ao pastor de natureza
superior e humano e o povo ao gado de natureza inferior e não-humano, que
porventura lhes serve de alimento.
Da concepção aristotélica de que uns
homens nascem escravos e outros para governar, Rousseau afirma ser correta.
Porém, é uma idéia que toma o efeito pela causa, pois nascendo escravos os
indivíduos perdem a vontade de se libertar e tomam gosto pela servidão. A força
constituiu os primeiros e a covardia os perpetuou.
III – Do Direito do Mais Forte
Se a força não se converter em direito
e a obediência em dever, o mais forte não será sempre o senhor, pois ceder à
força é um ato de necessidade ou prudência e não de vontade. Se o direito vem
da força, então poderia uma força maior sobrepor legitimamente tal direito, uma
vez que o mais forte tem sempre razão. Assim, Rousseau afirma que a força não
faz direito e que só se deve obedecer à legítima autoridade.
IV – Da Escravidão
Se um homem não possui autoridade
natural sobre outro e se a força não produz direito, restam as convenções como
base da autoridade legítima entre os homens.
Neste sentido, Rousseau refuta a
afirmação de Grotius de que um povo pode alienar a sua liberdade e tornar-se
escravo de um rei em troca de subsistência ou tranqüilidade civil. Sobre a
premissa inicial, diz ser o rei quem retira a subsistência do povo em favor da
própria. Quanto à tranqüilidade civil, Rousseau lembra que as guerras causadas
pela ambição e avidez do rei afligem mais que as dissensões do povo. Também, a
tranqüilidade não é fundamento absoluto no sentido de que também se vive
tranquilamente em um calabouço, por exemplo. Afirmar que um homem se aliena
gratuitamente é inconcebível e quem o faz não se encontra de posse de seu
juízo. Supor a alienação de um povo inteiro é loucura, e loucura não faz
direito.
Supondo, então, a alienação de cada
indivíduo, estes não poderiam alienar seus filhos, visto que nascem livres e
que apenas eles podem dispor de si próprios quando atingirem a idade da razão.
Um governo arbitrário só seria legítimo se cada geração fosse senhor de
admiti-lo ou rejeitá-lo, mas assim tal governo já não seria arbitrário.
Renunciar à liberdade é renunciar a
qualidade de ser humano e não há compensação possível para quem a renuncie. É
vão e contraditório estipular uma convenção entre uma autoridade absoluta de um
lado e uma obediência sem limites de outro.
Sobre a origem do direito de
escravizar proveniente da guerra, onde o individuo vencido abre mão da
liberdade para não ser morto pelo vencedor, Rousseau lembra que o direito de
matar os vencidos não resulta de um estado de guerra pelo simples fato de que
os homens na primitiva independência não possuíam relações tão freqüentes que
configurem estado de guerra ou estado de paz. A guerra é constituída pela
relação das coisas, de Estado para Estado, onde os particulares são
acidentalmente inimigos apenas enquanto defensores do Estado, na qualidade de
soldados que, se rendendo ou se depondo, deixam de ser inimigos e voltam a ser
simplesmente homens, não podendo outros dispor sobre suas vidas.
Se o direito de conquista se
fundamenta na lei do mais forte e se a guerra não dá direito de massacrar os
vencidos, a escravatura também não justifica. Mesmo se admitisse o direito de
tudo matar, os conquistados só obedecem porque são forçados.
Por qualquer lado que se observe, o
direito de escravizar é nulo por ser ilegítimo e absurdo. As palavras direito e
escravatura são contraditórias.
V – É Preciso Remontar Sempre a um
Primeiro Convênio
Submeter uma multidão não é reger uma
sociedade. Mesmo considerando como ajuntamento, o seu chefe continua um
particular que possui interesse distinto do interesse dos subjugados.
Um povo é um povo antes de se submeter
a um líder e este ato de doação pressupõe uma decisão pública. Todavia, o ato
que institui um povo como tal, que verdadeiramente fundamenta a sociedade, é
anterior ao ato pelo qual se elege o rei. Se não houvesse tal convênio anterior,
não haveria obrigação dos poucos indivíduos se submeterem à escolha da maioria.
VI – Do Pacto Social
Rousseau supõe que os indivíduos se
uniram para transpor os obstáculos que sozinhos, em seu estado natural, não
conseguiriam. A raça humana não sobreviveria sem a força proporcionada pela
união.
A soma das forças surge apenas quando
muitas pessoas se unem. Entretanto, a liberdade e a força são os principais
instrumentos de conservação individual. O contrato social, assim, é o ato
necessário para que a união preserve cada individuo e seus respectivos bens,
obedecendo a si próprio e livre como antes.
As cláusulas do contrato social,
embora nunca enunciadas, são reconhecidamente iguais em todos os lugares. Tais
cláusulas são de tal modo determinadas pela natureza do ato que qualquer
alteração o anula e, infringido o pacto social, os indivíduos voltam à
liberdade natural e perdem a liberdade contratada.
Todas as disposições do contrato se
reduzem na alienação total e sem reservas do indivíduo e seus direitos em favor
da comunidade. Se todo individuo assim procede, a condição é igual para todos e
não há motivos se onerar os demais. Se alguém resguardar qualquer direito, a
falta de um juiz comum entre este e os demais faria com que cada indivíduo
julgasse, além dos próprios atos, os atos dos demais, o que tornaria a
associação tirânica ou inoperante.
Cada qual, se doando a todos, não se
doa a ninguém. Se ganha o que se perde e mais força para conservar o que
possui. Cada um deposita sua pessoa e seu poder sob a direção geral e recebe
cada um coletivamente como parte indivisível do todo.
O pacto social produz um corpo moral e
coletivo composto pela totalidade dos indivíduos que o instituiu. A pessoa
pública formada pela soma das demais é conhecida como República ou corpo
político, enquanto os associados recebem o nome de povo, cidadãos ou súditos,
dependendo do contexto.
VII – Do Soberano
O ato de associação corresponde um
acordo recíproco do público com os particulares. Cada indivíduo se acha
obrigado como membro do soberano para com os particulares e como membro do
estado para com o soberano. O indivíduo não está obrigado consigo, mas com o
todo do qual faz parte.
A deliberação pública que obriga os
súditos em face do soberano não pode obrigar o soberano em face de si mesmo. É
contra a natureza do corpo político impor uma lei ao soberano não se pode
infringir. Isso não significa que esse corpo não pode se comprometer com outros
quando não derrogue o contrato, pois em relação ao estrangeiro esse corpo se
torna um ser simples, um indivíduo.
Todavia, esse corpo político ou
soberano não pode se obrigar a nada que derrogue o contrato, como alienar parte
de si ou se submeter a outro soberano. Violar o ato que o institui implica em
aniquilar-se.
Formado o corpo político, um ato
contra um membro implica em um ato contra o corpo. Também, um ato contra o
corpo implica em um ato contra seus membros. O dever e o interesse obrigam as
duas partes contratantes a se ajudarem. Os mesmo homens devem buscar reunir as
vantagens dessa dupla relação.
Sendo o soberano composto apenas pelos
indivíduos que o compõe, não tem e não pode ter interesse contrário ao deles,
prejudicando-os. Assim, o soberano não precisa dar garantias aos súditos. O
soberano é o que deve ser.
Entretanto, este caso não se aplica
dos indivíduos em relação ao soberano. Ninguém responderia seus compromissos se
não encontrasse meios de assegurar-se de sua felicidade.
Cada indivíduo, como homem, pode ter
interesse particular distinto do interesse comum, como cidadão. Como sua
existência independente do contrato, tende ele considerar que sua obrigação à
causa comum é uma contribuição gratuita. Visto que o Estado é um ser moral e
não humano, tende a gozar os direitos de cidadão sem querer cumprir os deveres
de súdito.
Para que o pacto social não constitua
um ato vão, todo o corpo constrangerá o individuo a obedecer à vontade geral.
VIII – Do Estado Civil
A passagem do estado natural ao civil
produz transformações no homem, substituindo o instinto pela justiça e
conferindo moralidade às suas ações. O homem se vê obrigado a agir conforme
princípios distintos dos naturais. Ao entrar no estado civil, o homem passa de
animal estúpido a um ser inteligente.
Esta mudança implica em perdas e
ganhos. Com o contrato social, o homem perde a liberdade natural e o direito
ilimitado sobre as coisas. Em contrapartida, ganha liberdade civil, liberdade
moral e propriedade do que possui. A liberdade natural é limitada pela força
individual e a civil pela vontade geral. A liberdade moral é o que torna o
homem senhor de si, enquanto o impulso do mero apetite é escravidão.
IX – Do Domínio Real
Os indivíduos alienam a si, seus
recursos e seus bens à comunidade no ato de sua formação. A natureza da posse
não muda se tornando propriedade nas mãos do Estado, mas a posse pública é mais
forte e mais irrevogável que a individual. O Estado, perante seus súditos, é o
senhor de todos os bens pelo contrato social. Entretanto, perante outras
potências, é senhor pelo direito de primeiro ocupante concedido pelos súditos.
O direito de primeiro ocupante apenas
se torna verdadeiro direito após o direito de propriedade se estabelecer. O
homem tem direito ao que lhe é necessário, mas o ato positivo, que o torna
proprietário, o exclui de todo o resto. Tornando-se proprietário de seus bens,
o homem deve se limitar a estes, sem nenhum direito à comunidade, que explica o
fato de o direito de primeiro ocupante, tão frágil no estado de natureza, ser
respeitável pelos homens civis.
Para se autorizar o direito de
primeiro ocupante devem ser observadas três condições: que o terreno não seja
habitado por ninguém, que só ocupe a porção que lhe é necessário e que se tome
posse não por cerimônia, mas pelo trabalho e cultivo, sinais de propriedade na
ausência de títulos jurídicos e que devem ser respeitados pelos outros.
Neste sentido, Rousseau demonstra a
ilegitimidade de ocupações que não obedeçam estas condições com o exemplo da
colonização espanhola nas Américas com Vasco Nuñes Balboa, qualificando-as como
usurpação punível.
As terras dos indivíduos, reunidas e
contiguas, se tornaram território público, e o direito de soberania, que se
estendia sobre os súditos, tornaram suas propriedades reais e pessoais, criando
uma dependência ainda maior dos possuidores que utilizam suas forças para a sua
felicidade. Reis antigos, que não percebiam essa vantagem, se denominavam reis
dos povos, como rei dos persas. Reis de hoje, mais hábeis, se intitulam reis
dos territórios, como rei da Espanha. Dominando os territórios se fazem mais
confiantes para dominar os habitantes.
Uma peculiaridade dessa alienação é o
fato de a comunidade aceitando as terras dos particulares, ao passo de
destituí-los, os garante posse legítima, transformando a usurpação em direito,
a fruição em propriedade e os possuidores em depositários do bem público, com
seus direitos respeitados pelos membros do Estado e sustentados contra o
estrangeiro.
Também pode ocorrer de os homens se
unirem sem propriedades. Apossando-se posteriormente de qualquer terreno, podem
usá-lo comunitariamente ou dividi-lo, seja em partes iguais ou em partes
apontadas pelo soberano. Independente de como se adquire a propriedade, o
direito do particular sobre os seus bens está subordinado ao direito que a
comunidade tem sobre tudo.
Encerrando o Livro I e o Capítulo IX,
Rousseau faz uma observação que fundamenta todo o sistema social. Assevera que
ao passo de extinguir o direito natural, o pacto fundamental substitui por uma
igualdade moral a desigualdade dos indivíduos, seja de força ou talento,
tornando-os iguais por convenção e direito.
Bibliografia:
Rousseaul, Jean-Jacques. Do Contrato
Social. Tradução de Ricardo Rodrigues da Gama. 1ª ed. São Paulo: Russel, 2006.
OLÁ JUSSÁRA! QUAL SEMESTRE ESTÁ CURSANDO? ESTÁ FAZENDO DIREITO OU PSICOLOGIA?
ResponderExcluirOLÁ! Estou cursando Direito 6º Período.
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